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O QUE PODE MOTIVAR A JUSTA CAUSA?

justa causa

Uma das grandes dúvidas existentes entre os empregadores é a questão da despedida do empregado por justa causa. 

Por isso se torna necessário esclarecer alguns pontos importantes para as corretas caracterização e aplicação da justa causa. 

Em razão da complexidade da matéria, o tema será dividido em três partes.

CONCEITO

Em sentido geral, a justa causa é todo o ato doloso ou culposamente grave ou reiterado que faça desaparecer a confiança e a boa-fé que deve haver entre empregado e empregador, tornando, assim, impossível o prosseguimento da relação.

DA JUSTA CAUSA DO EMPREGADO (CONCEITO E REQUISITOS)

Dessa forma, cabe justa causa a partir de todo ato ilícito do empregado que, violando alguma obrigação legal ou contratual, explícito ou implícito, permite ao empregador a rescisão do contrato sem o pagamento do aviso prévio, da multa de 40% sobre o saldo do FGTS, do 13ª salário e das férias, estes dois proporcionais.

Assim, entre os requisitos objetivos estão a gravidade do comportamento do empregado, porque não há justa causa sem a ação ou omissão não representem nada. Também conta o imediatismo da rescisão, sem o que pode desaparecer a justa causa comprometida pelo perdão tácito com a falta de atualidade da dispensa em relação ao conhecimento do fato pelo empregador. Outro ponto é a relação direta entre a causa – ato faltoso – e seu efeito – despedimento. Vale também a singularidade, para significar que é vedada a dupla punição pelo mesmo ato ou omissão. 

PROPORCIONALIDADE ENTRE ATO FALTOSO E PUNIÇÃO

No caso, o poder disciplinar reconhecido ao empregador autoriza-o a punir o empregado que comete uma falta, advertindo-o verbalmente ou por escrito, suspendendo-o do serviço ou despedindo-o.

Com base nos princípios do bom senso e da justiça, há de existir uma proporcionalidade entre o ato faltoso e sua punição. Nesse sentido, o empregador pode aplicar as penas menos severas para as infrações mais leves e reservar o despedimento para as mais graves.

Eis o requisito único do ato faltoso: a gravidade. As faltas leves e de pouca importância justificam apenas punições de advertência e de suspensão.

Em princípio, a desproporcionalidade entre o ato faltoso e sua punição pode assumir dois aspectos: rigor excessivo da pena e benevolência da punição. No primeiro caso, excedendo-se na pena aplicada, exorbita o empregador de seus poderes de comando e responde pelas consequências de sua reação desmedida. A situação pode levar à cassação judicial do seu ato e ao ressarcimento dos prejuízos causados ao empregado. No segundo, corre o empregador o risco de ensejar a indisciplina entre os empregados, por ter sido a punição branda de mais.

AVALIAÇÃO DA GRAVIDADE

Antes de tudo, ao se examinar a falta cometida pelo empregado, há que fazê-lo sempre sob dois pontos de vista. Objetivamente, levando-se em conta os fatos e circunstâncias materiais que envolveram a prática do ato faltoso, tais como o local e o momento. E, subjetivamente, considerando-se a personalidade do agente, isto é, os antecedentes do faltoso, seu grau de discernimento sobre as circunstâncias que provocaram o ato ou omissão etc.

Para avaliar a gravidade da falta, os elementos objetivos auxiliarão a determinar a intensidade da infração. Já os fatores subjetivos serão levados em conta na apuração do grau de abalo de confiança, fundamental na relação de emprego, sem a qual não se sustenta o pacto. 

Assim, do ponto de vista objetivo, somente haverá justa causa para a dispensa do empregado, quando o ato faltoso por ele praticado constituir uma violação séria das principais obrigações resultantes do contrato de trabalho. 

Por outro lado, do ponto de vista subjetivo, somente existirá justa causa para o rompimento do vínculo se resultar irreversivelmente destruída a confiança depositada no empregado, de tal forma que se torne virtualmente impossível a subsistência da relação de emprego. 

ATUALIDADE DO ATO FALTOSO

Assim que tomar conhecimento da prática de um ato faltoso, deve o empregador providenciar a aplicação imediata da penalidade, sob pena da demora ou omissão ser considerado um perdão tácito. Caso perca a atualidade, o ato faltoso não poderá justificar qualquer pena.

Dessa forma, a atualidade da falta deve ser apurada a partir do momento em que a pessoa que tem poderes para aplicar punições, dentro da organização da empresa, tomou conhecimento da prática faltosa. Pouco importa quando ocorreu a infração; mesmo sendo antiga. Ela torna-se atual a partir do momento em que venha a ser conhecida, pois não seria possível punir uma falta antes de conhecê-la.

Porém, não se pode exigir que todas as faltas sejam punidas instantaneamente, no minuto em que cheguem ao conhecimento da direção. Isso porque, nas grandes organizações empresariais, o processo de tomar ciência, verificar, apurar, avaliar um ato faltoso e aplicar a penalidade correspondente, gera tempo para que a decisão adequada seja tomada.

Mesmo nas pequenas empresas deve ser evitada a instantaneidade da reação do empregador, ao punir o empregado. A cautela é necessária, porque reagindo afoitamente pode o empresário se deixar levar pela emotividade e cometer injustiças.

Ao contrário, a falta deve ser bem examinada, sopesadas as circunstâncias, verificada a personalidade do infrator, sua vida funcional e todos os demais fatores que envolveram a prática faltosa. Somente após esse cauteloso exame, estará o empregador, na justa medida, aplicando punição proporcional à gravidade da falta cometida pelo empregado.

MOTIVOS DE JUSTA CAUSA DO EMPREGADO

Segue breve explanação sobre os motivos que podem levar à despedida por justa causa elencadas no artigo 482 da CLT.

a) ATO DE IMPROBIDADE

É a ação ou omissão dolosa do empregado, visando vantagem para si ou para outrem, em decorrência do emprego e com prejuízo real ou potencial para alguém. 

No caso, trata-se de um ato lesivo contra o patrimônio da empresa, de terceiros ou de colega de trabalho. São atos que revelem claramente desonestidade, abuso, fraude ou má-fé. Por exemplo, furto, roubo, empregado que recebe comissão do fornecedor, apropriação indébita de valores da empresa, falsa declaração de dependentes para fins de recebimento de salário-família. 

b) INCONTINÊNCIA DE CONDUTA OU MAU PROCEDIMENTO

Incontinência é a vida desregrada. É a prática de atos imorais, com a perda de respeitabilidade. É o comportamento desordenado em público, contra os bons costumes. É a participação em rixas, o desrespeito com colegas de trabalho ou uso de linguagem e gestos obscenos. 

Já o mau procedimento é quando o empregado pretende causar um prejuízo, real ou potencial, dolosamente, por má-fé. Ele difere do ato de improbidade, no qual o empregado o pratica para obter um proveito próprio.

c) NEGOCIAÇÃO HABITUAL

Basicamente, é o ato de concorrência desleal ao empregador ou o inadequado exercício paralelo do comércio a sua causa. 

O empregado pode prestar serviço a mais de um empregador, mas se essa atividade se traduzir em concorrência desleal ao empregador ou prejudicar o serviço do empregado, estará caracterizada a justa causa. 

Ainda, há de se salientar que a justa causa se dá quando a negociação é habitual. Logo, um ato esporádico não constitui falta grave.

d) CONDENAÇÃO CRIMINAL

Se o empregado é réu em um processo criminal e for condenado definitivamente a cumprir pena privativa de sua liberdade, por óbvio que não poderá continuar no emprego. 

Então, a empresa poderá despedir o empregado por justa causa. 

Nesse caso, é desnecessário que os fatos que determinaram a condenação criminal estejam relacionados com o serviço. A simples condenação sem suspensão da pena é o fundamento desta justa causa.

e) DESÍDIA

Em síntese, desídia é a falta culposa, e não dolosa, ligada à negligência.

Nesse sentido, costuma se caracterizar pela prática ou omissão de vários atos (comparecimento impontual, ausências, produção imperfeita). 

Por exemplo, entre as manifestações mais comuns de desídia estão, além das conversas em prejuízo ao serviço, a morosidade de labor, acarretando diminuição dos bens produzidos. 

O desleixo, determinando a confecção do serviço defeituoso, também é caracterizado como desídia. 

Além disso, a má vontade para trabalhar, em uma espécie de irritante resistência passiva às ordens recebidas também pode ser levada em conta. 

Outros fatores como a desatenção do recepcionista para com os fregueses da empresa e, no caso especial do vigia, porteiro ou vigilante dormir durante a jornada, são considerados desídias e, portanto, passíveis de despedida por justa causa.

f) EMBRIAGUEZ 

A embriaguez, do ponto de vista mais amplo, envolvendo o uso de álcool ou tóxicos, é justa causa para o despedimento do empregado. 

No caso, haverá embriaguez quando o indivíduo, intoxicado, perde o governo de suas faculdades a ponto de tornar-se incapaz de executar com prudência a tarefa que lhe cabe. 

Com isso, a justa causa pode se configurar de duas formas: 

Primordialmente, pela embriaguez habitual fora do serviço e na vida privada do empregado, mas desde que transpareçam no ambiente de trabalho os efeitos dessa situação de ebriedade. 

Em outra situação, pela embriaguez no serviço, instantânea e que se consuma em um só ato, mediante a simples apresentação do trabalhador no local de trabalho em estado de embriaguez ou desde que se ponha em tal estado durante o serviço.    

No entanto, deve-se ter certo cuidado na aplicação desta justa causa, porque se a embriaguez é habitual (crônica), ela pode ser entendida como doença. Neste caso, caberia o empregador encaminhar o empregado para um tratamento médico ou para o INSS e não rescindir o contrato de trabalho por justa causa.

A princípio, o alcoolismo, a dependência do indivíduo ao álcool, é considerada doença pela Organização Mundial da Saúde sob a denominação de Síndrome de Dependência do Álcool. É uma doença que compromete as funções cognitivas do indivíduo, prejudicando a execução de suas tarefas profissionais. Não seria, portanto, um desvio de conduta que justificasse a rescisão do contrato de trabalho.

g) VIOLAÇÃO DE SEGREDO

A violação de segredo da empresa também é motivo para despedida por justa causa. Trata-se da divulgação não autorizada das patentes de invenção, métodos de execução, fórmulas escritas comerciais. Enfim, de todo fato, ato ou coisa que, de uso ou conhecimento exclusivo da empresa, não possa ou não deva ser tornado público, sob pena de causar prejuízo remoto, provável ou imediato à empresa.

h) INDISCIPLINA

A despedida por justa causa também pode se dar por indisciplina. É o descumprimento de ordens gerais de serviço, dirigidas impessoalmente ao quadro de empregados. Por exemplo, recusar-se à revista obrigatória na saída do expediente ou não obedecer a ordem de proibição de fumar no local de trabalho.

i) INSUBORDINAÇÃO

Já a insubordinação é o descumprimento de ordens pessoais de serviço. É a desobediência a determinada ordem pessoal endereçada a certo empregado ou a pequeno grupo de empregados. Difere de indisciplina porque a ordem infringida não tem o caráter de generalidade, mas, sim de pessoalidade. Não se trata de uma regra geral, mas uma ordem específica àquele indivíduo, e que foi desobedecida.

j) ABANDONO DE EMPREGO

Além das motivações acima citadas, o abandono de emprego também autoriza a despedida por justa causa. Configura-se abandono pela ausência reiterada ao serviço sem justo motivo e sem permissão do empregador. Ou ainda pela ausência justificada, mas sem comunicação ao empregador dos motivos que a justificam. 

Nesse caso, dois requisitos o caracterizam: o decurso de um período determinado de ausência ao serviço e a intenção manifesta do empregado de romper o contrato.

Não há um prazo fixado pela lei para que o abandono se configure, o judiciário trabalhista fixou em trinta dias o lapso de tempo para que, da reiteração da ausência, resulte a figura do abandono.    

l) ATO LESIVO DA HONRA E DA BOA FAMA PRATICADO NO SERVIÇO CONTRA O EMPREGADOR, OU SUPERIOR HIERÁRQUICO OU CONTRA QUALQUER PESSOA, OU OFENSAS FÍSICAS, NAS MESMAS CONDIÇÕES, SALVO EM CASO DE LEGÍTIMA DEFESA, PRÓPRIA OU DE OUTREM

A ofensa à honra do empregador ou terceiro, relacionada com o serviço, mediante injúria, calúnia ou difamação, permite a despedida do empregado por justa causa. 

Da mesma forma é motivo de rompimento do contrato de trabalho a ofensa física, tentada ou consumada, contra o superior hierárquico, empregadores, colegas ou terceiros, no local de trabalho ou em estreita relação com o serviço.

m) PRÁTICA CONSTANTE DE JOGOS DE AZAR

Outra motivação para o rompimento do contrato de trabalho são os jogos de azar, apenas aqueles assim descritos pela legislação contravencional em vigor no país. Por exemplo, jogo de bicho, rifas não autorizadas, apostas de corridas de cavalo fora de local autorizado etc. 

Desde que o empregado se dedique constantemente a jogos de azar, motivará a justa causa.

n) PRÁTICA DE ATOS ATENTATÓRIOS À SEGURANÇA NACIONAL    

Por fim, o empregador pode despedir seu empregado que pratica atos atentatórios contra a segurança nacional, desde que apurados pelas autoridades administrativas.  

 

*Sócio do De Bellis Advogados Associados. Especialista em Direito do Trabalho.

 

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